Realizou-se no dia 28 de setembro, no Coliseu dos Recreios, em Lisboa, a 29.ª edição dos Globos de Ouro da SIC, que distinguiram o que de melhor se fez em áreas como a música, o cinema, a televisão ou o humor.
Na categoria Melhor Canção, o tondelense Samuel Úria venceu com a canção “2000 A.D”.
Este tema integra o álbum homónimo, que parte do imaginário ligado à mudança do milénio — o ano 2000.
A canção impôs-se a concorrentes de peso, como “Deslocado”, com que os NAPA representaram Portugal no Festival Eurovisão deste ano, “Diga 33” de A Garota Não, bem como as versões de “E Depois do Adeus” e “Essa Mulher”, interpretadas por Gisela João e Nuno Ribeiro, respetivamente.
Visivelmente surpreendido, Samuel Úria não escondeu a emoção no discurso de agrad
ecimento e assumiu que ganhou “com uma canção que renega o presente, porque o presente não está fixe, o presente está ingénuo e cheira mal”. “Eu não quero regressar ao passado, mas desejo muito que possamos fazer justiça aos ideais que nos congregaram a todos e que hoje parecem estar a esmorecer”, acrescentou.
Entre aplausos, o músico dedicou ainda o prémio ao pai, que celebrou nesse dia 80 anos.
“2000 A.D.”, lançado em 2024, junta-se a sucessos já bem conhecidos do artista, como “Lenço Enxuto”, “Fica Aquém”, “O Muro” e “Carga de Ombro”.
Samuel Úria é hoje considerado um dos nomes mais respeitados da música portuguesa. Com sete álbuns editados, mantém a ligação à cena alternativa e ao universo indie, mas a sua escrita tem vindo a conquistar espaço em diferentes géneros, com canções assinadas para artistas de referência como Ana Moura, António Zambujo, Clã ou Katia Guerreiro.
Nasceu em 1979, em Tondela, filho de Madalena e do enfermeiro Úria, de Tondela e Lajeosa do Dão respetivamente. É neto de Armelim Jesus, que tinha a sapatilha Confiança, na então vila de Tondela e foi galardoado pelo Município de Tondela em 2017, com o galardão municipal, que nas palavras do Presidente de Câmara de então José António de Jesus, “são um estímulo para os valores do humanismo, da investigação, da cultura e, acima de tudo, para os valores mais nobres que é o respeito pelo trabalho sério ao serviço da sociedade nos seus múltiplos planos de ação”.
Em 21 de junho de 2013, deu uma entrevista ao jornal Folha de Tondela, onde deu a conhecer a importância das suas raízes, na sua gestação de criação “onde quer que eu esteja, no sítio mais barulhento e não estou só a dizer isto por ser a “Folha de Tondela”, se eu quero escrever uma canção eu mentalmente tenho que regressar a Tondela. Espaço amplo e agradável para me inspirar nas canções”.
Nessa altura, falou da música como sentimento de transformação pessoal e coletiva.
“Eu acho que a música sempre teve essa função. As músicas tentam transformar as coisas para melhor. Por outro lado a música pode funcionar quase como um escape do que está mal e também nos leva a uma fuga deste clima acinzentado que nos rodeia. Hoje em dia a responsabilidade de um artista sobretudo em Portugal, é um bocado tentar encontrar o equilíbrio, as duas coisas. Por um lado criar um tipo de música que não faça parte do problema e que não aumenta a carga negativa, e por outro lado levar as pessoas para o prazer de ouvir música e conhecer uma sociedade que se predispõe a ultrapassar esta fase”.
Definiu as suas músicas e canções, “as letras são bastante pessoais e quanto mais pessoais são, menos quero que pareçam, e quando há coisas que eu tenho mesmo de dizer, que me revelam muito, tento codifica-las com comentários engraçados quando digo algo muito duro.
Então se eu quiser falar da minha música acho que é uma música de escape ou de fuga, aquilo que ela é. Em casa não tenho uma estante com um só género musical e por isso também não o faço. Poderia classificar a minha música/canções como diversidade e fuga, estas palavras classificam-na bem”, as mesmas musicas e canções que conquistaram o globo de ouro.
Samuel Úria depois dos Globos de Ouro, revelou nas redes sociais o que lhe ia na alma, “A surpresa é o que é. Acontece com as nomeações, intensifica-se com as distinções. Ao contrário do que possa parecer, há até certa imodéstia nisto: em canções tão pessoais como as minhas – onde grassam temáticas impopulares, crueza e excesso, mel e fel, conscientes auto-sabotagens – eu acredito poder alcançar mil efeitos, mas nenhum desses efeitos em que creio passa pela conquista de prémios.
Demasiado peculiar para prémios, eis a imodéstia.
A surpresa é o que é, e é muito boa. Na estatueta dourada, um memorial da bênção contida nesta atividade de fazer música, contida nos ouvidos que me preservam. A coroar tudo, a alegria partilhada de tantos e tantos amigos, de desconhecidos, dos queridos tondelenses com quem mantenho mútua pertença.”
Não é modéstia, nem simplicidade disfarçada, porque já em 2013 na entrevista ao nosso jornal, na edição nº 1880 de 21 de junho de 2013, Samuel já tinha declarado “eu por muitos defeitos que encontrasse em Tondela, Tondela continua a ser a minha casa e continua a ser a minha família e quando cá estou comento alguma coisa que por cá se passa, mas quando estamos longe não deixamos que ninguém fale mal dela”
MJJ
Folha de Tondela Jornal centenário da região de Viseu